sexta-feira, 11 de junho de 2010
O abutre e a esposa morta
Ele jogava as chaves para o alto e pegava no ar evitando olhar pra elas. Cantarolava mentalmente uma canção no ritmo monótono do bater das chaves, um 4x4 perfeitamente duro e chato. Seus olhos, fugindo das chaves, percorriam o quarto e o corpo nu à sua frente. Mesmo azulada ela continuava linda.Desejava-a nesse momento como da primeira vez que a viu, e mesmo com os buracos de bala molhando de sangue a cama desarrumada ela continuava sendo a mulher de sua vida, tudo o que sempre quis. Tentava se concentrar nas lembranças. Da primeira vez que conversaram, de cozinhar pra ela, trocar pneu na chuva. Lembrava da primeira noite de sexo, da falta de jeito misturada com um tesão louco, uma vontade de canibalizar aquele corpo, de fazê-lo em pedaços com os dentes e unhas, enquanto gozava gritando, alto, salivar, blasfêmo. Amava os cabelos dela, e a forma que desenhavam os ombros, amava seu pescoço e suas pernas, seu púbis e todos os segredos que enxergava naquele corpo e que recitava sorrindo freneticamente ao se masturbar no chuveiro. Quando se casaram ela estava mais linda que nunca, e tudo nela convidava ao crime e ao abuso e tudo depois daquele dia manteve aquele cheiro e aquela cor, algo meio pecaminoso, como uma planta carnívora ou o dorso nu do deus morto na cruz. Seis anos depois seu desejo por ela estava cada vez maior, como um vício mórbido, inconfessável, cultivado no morno do cobertor, nos cantos de parede. Ficava ao seu lado, olhando seu dorso de mover durante o sono, vi-a no escuro absoluto, com olhos griz de abutre. No sétimo aniversário foram a um motel. Fizeram aquele amor canibal da primeira vez. Gozou na barriga dela enquanto ela sorria de olhos fechados. Ela virou de bruços, limpando a porra no lençol e se aninhando para dormir. Ele tomou um banho e se vestiu, abriu a pasta e pegou a arma, comprada na praça sete por 150 reais. Dois tiros nas costas, ela não gemeu nem abriu os olhos. Morta. Agora era esperar o desejo ir embora com o sangue escorrendo, e com o tilintar monótono das chaves na palma da mão.
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Nossa, que romântico!!!
ResponderExcluirQue discípulo meu é este?
Palahniuk é meu senhor e nada me faltará - palavra da salvação...
ResponderExcluirPalahniuk (que eu adoro) foi foda.
ResponderExcluirAlgumas pessoas temem perder a única beleza que consegue abstrair em outrem: algo superficial que se transformará (ah! humor negro) em algo que ele detestará, e que o lembrará sempre de quão belo já fora: nosso 'eu' Dorian Gray.
Gata,
ResponderExcluirEu sou foda !!!!
Dorian Gray era gay!!!!
Não confunda focinho de porco com tomada!!!
Hum-rum.
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