sábado, 14 de novembro de 2009

Nada surpreende

Cada vez mais em compulsão se perpetua este jeito nada original de se render ao cotidiano. O mundo, o fantasma do que se espera dele que nos assombra, tudo isso conjugados conosco, invade uma contramão sem espaço pra duas vias, levando a um destino fatal. É a tecnologia com toda comodidade e estrutura cultural que pode proporcionar, de encontro com uma velocidade a qual somos incapazes de digerir. Paralelo a isso, esta mesma tecnologia deu voz a um universo populoso de pessoas que não sabiam que existiam e hoje têm voz pra convencer até a si mesmas de suas meias verdades. O que aparentemente supõe uma idéia de liberdade e incentivos para debates que contribuam para uma sociedade menos retroativa tem se mostrado uma cartilha de alienação. Há muito pouco tempo para dissecar uma informação, que ao explodir no meio a necessidade de ser tudo-ao-mesmo-tempo-agora, faz o novo virar clichê, repetitivo, desgastante e repulsivo. O surpreendente já não surpreende mais, e o comediante ainda assim faz piadas da surpresa, o jornalista ainda assim cria pautas sobre a surpresa, o cidadão comum ainda assim se adapta ou fica indignado com a surpresa. Surpresa morna, sem muito gosto, apática. Todo mundo quer ser formador de opinião, e se prestarem atenção, nem discutiram. Os presos aos princípios continuam presos, e os que ousam desafiar-se continuam dando murro em ponta de faca. A insanidade é que o raciocínio não tem a menor coerência na maioria das vezes. É como se o todo separasse sua essência em pequenos fragmentos descartáveis e brincasse de ser original. Arremete uma sensação de que ninguém sabe mais nada e está todo mundo perdido. Quer se fechar do mundo no vazio de si mesmo? Não se tranca mais a porta, fica offline. Qualquer forma de lutar por um ideal é louvável e deve ser admirada, mas quando se vê magia na história da humanidade, soa estranho que protestar seja sinônimo de personificar um acontecimento no avatar de qualquer site de relacionamento... Nada é dispensável se intenso até o fim, portanto, não há nenhuma tentativa de banalização do homem ou da máquina aqui presente. O que prevalece é o ponto de vista de que a ponte que liga este homem à máquina: o raciocínio, tem se deixado levar pela aparente falta de necessidade de conexão. E se este raciocínio não está ativo, nada faz sentido. Há uma linha muito tênue entre a incoerência e a contradição, e esta segunda é o caos necessário. Porque afinal, não existe ordem sem caos. Seguindo o raciocínio de Mario Quintana: quem não se contradiz, mente. Ser autêntico custa admitir erros sem precisar dizer, pois não há verdade sem equívoco. Ainda sim, ser autêntico continua sendo ter uma identidade mesmo que ela não signifique nada. Afinal, pra que ser alguma coisa, se ser algo tem sido ser coisa alguma?

Um comentário:

  1. dizem por ai que estamos ficando burros pelo acúmulo de informação. Mas o que me espanta é que dizem isso com tranquilidade, como se já tivesse, todos, aceitado a condição de alienação quando ao próprio pensar.

    O que estamos no tornando? tenho me perguntado isso a cada dia, a cada escolha. Almodóvar disse através de uma de suas personagens que ser autêntico custa caro...às vezes é caro demais, mas é um preço que vale ser pago. Você só pode ser aquilo que puder pensar, refletir... o valor da sua vida é a filosofia que vc faz dela.

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