terça-feira, 12 de maio de 2009

Um acalanto no adeus

Recebi um telefonema, Eduardo me convidara para jantar com ele naquela noite. Iríamos a algum tradicional restaurante, sempre íamos. Arrumei-me como sempre me arrumo, sem muita atenção (ou seja, sempre tive certa preguiça de me vestir ‘atraentemente’, e inexplicavelmente isso atrai).

O Eduardo sempre foi um homem fantástico, e eu o amava. Amava a vida que tínhamos, amava que ele aceitasse a minha forma de não ver o mundo. Era um homem bonito fisicamente, inteligente, carinhoso, sarcástico... Eu amava estar ao lado dele por prazer.

No restaurante, enquanto tomávamos uma taça de vinho, eu roçava meus dedos na borda da taça, pensava em qualquer coisa aleatória que não era o jantar em si. E foi quando ele tocou de leve em minhas mãos, e me olhou com um olhar atraente, um olhar intenso, profundo como se fosse um estranho em quem eu confiasse e que me convidasse silenciosamente para ir com ele para qualquer lugar que, sequer, eu tenha ouvido falar. Sorri de leve ao perceber que o conhecia muito bem, e que ele não me era nada estranho.

O jantar ia passando, as horas iam sendo esquecidas. Eu ria como criança, sem muito me preocupar com a altura da voz ou a maneira como me porto ao rir. E ele adorava tudo aquilo. Adorava meu jeito espontâneo de esquecer que outras pessoas nos observavam, de sorrir ao garçom, que por vezes falava algo além do obrigatório... Nos amávamos.

Ele me disse certa vez que gostava muito de me ver dormir, que eu parecia tão distante. Que eu sempre me deito sozinha, e que ele é quem tem de chegar perto. Que por mim, até dormiríamos em camas separadas (nunca gostei da meiguice comum e chata da idéia romântico-fracassada do ‘dormir de conchinha’. As pessoas são tão óbvias e iguais que me irrito facilmente.).

Pedimos a conta, e ao sairmos do restaurante, ele disse que queria me levar a um lugar especial. Minha mente viajou incansavelmente à procura de tal lugar, e por fim contentei-me em saber que não seria um lugar qualquer, comum... relevante. Entramos no carro e ele me deu o roteiro (adorava dirigir, e não gosto de conversar em quanto dirijo. Me sinto como ‘Anakin Skywalker’ pilotando em fuga por alguma hiper-estrada), chegamos a uma praça, onde pessoas caminhavam. Saí do carro e abri a porta para ele (sim, às vezes eu bancava o ‘pseudo-cavalheiro’.) e sorri... gargalhei. Demos os braços como dois bons amigos, e nos colocamos a andar, em nível bem menos frenético do que os que faziam caminhada. Olhei para uma mulher muito bonita e de pernas bem torneadas, lado a lado com um homem igualmente bonito, e comentei “quantas horas eles desperdiçaram por aqueles corpos? Quantos livros deixaram de ler?”, Eduardo apenas cantou “deixando a profundidade de lado...”.

Enquanto andávamos, conversávamos sobre assuntos dos mais diversos, dos mais interessantes. Amava de tesão conversar com Eduardo. Mas, de repente, algo aconteceu. Ele me virou bruscamente, olhou em meus olhos, e disse-me “Aline, quero me casar com você. Mas, por Deus, não me responda nem que sim, nem que não. Você não é capaz de uma decisão destas às pressas. Pense sobre e me avise depois. Apesar de o resultado ser indiferente. Estaremos juntos independentemente da resposta.”. Eu fiquei imóvel, incrédula “como aquele patife pôde me propor algo assim?”. Ele aproximou-se de meu rosto, segurou-o e deu-me um beijo nos olhos (ele sabe que eu amo quando faz isso), e saiu. Pegou um taxi e foi embora.

Não sabia o que pensar, aliás, eu não queria me casar, e não casaria. Foi então que eu soube, que eu vi: o amava por ele ser eu, por ele me divertir, por ele me deixar viver como quero. Como se há muito já tivesse conhecimento de tal pensamento, decidi, naquele momento, que não amaria alguém que amasse em mim... apenas o que amo em mim mesma. Não preciso de alguém para ser o meu reflexo. Nunca mais deixei que beijassem meus olhos.

3 comentários:

  1. interessante: ela "desistiu" quando percebeu que ele só gostava nela as coisas que ela também amava. uma espécie egoísta (e eu não acho isso ruim) de lutar a seu favor. o que não se questionou foi: por que ela se interessou por alguém que fosse apenas... uma parte dela?

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  2. Talvez ela não 'confie', ou não tenha 'segurança' naquilo que a torna diferente, então precisa de alguém para mostrar que, realmente, são boas 'qualidades' e diferentes. Corroborar com o 'gosto' dela.

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  3. Lorena, vou ser sincero: que belo texto.
    Caramba, muito bem escrito, eu não diria que foi feito por alguém que não é escritor por profissão (na verdade, "escritor por profissão" é algo um pouco barato, né não?). Demais, adorei, adorei mesmo.

    Eu pagaria por textos assim, em um livro.
    Se aceita minha dica: continue! A combinação de um texto bem escrito com uma idéia legal gera um mundo paralelo tão real quanto esse aqui (afinal, é real mesmo? Se sensações são a nossa realidade, então, PQP!)

    Barabééns, você foi extrema!

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